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Educação Popular e a Arte do Bem Viver

O SORRISO DE BEM VIVER E DE ACOLHER

Para quem chega na Aldeia do Povo Apiaká, no Rio dos Peixes,  é recebido e acolhido pelas crianças, que correm até a beira do rio para nos receber e ajudar a carregar nossa bagagem.

“Somos o povo Apiaká, habitante da região noroeste do Mato Grosso, próxima à cidade de Juara. O nome do nosso povo não tem um significado em português, os antigos dizem que é o nome de um marimbondo vermelho que, ao ser provocado, persegue o provocador por longas distâncias até conseguir ferroá-lo. Um pesquisador chamado E. Wenzel também disse que “apiaká” é uma variante do termo Tupi “apiaba” que significa “pessoa”, “gente” (cf. WENZEL, 1999), mas nós não sabemos muito bem, os antigos não confirmam essa versão.”

Seu sorriso e aproximação deixaram-me totalmente em casa, e mais ainda porque, a não ser à noite para dormir, sempre estavam ao nosso lado e nos acompanhavam por todo lugar onde íamos, nas visitas nas casas, no campo de futebol, no rio quando íamos banhar ousimplesmente, contemplar os peixes, o nascer ou o pôr do sol.

As meninas então, eram companheiras permanentes e sempre partilhávamos o que tínhamos para o almoço ou o jantar.

Nosso objetivo de ir para as aldeias era de conviver e desenvolver com as crianças, adolescentes e jovens atividades voltadas para a agroecologia, o cuidado com a natureza, os animais, as plantas e as pessoas, cultivando os costumes, as brincadeiras, as tradições de sua cultura, desenvolvendo sempre uma alimentação saudável.

Dessa forma, usamos de uma metodologia que atraísse seu olhar, sua atenção e ao mesmo tempo, as divertisse aprendendo e interagindo conosco e com o seu meio.

O teatro de fantoches, com personagens da natureza, animais, plantas e pessoas foi de encontro ao seu dia a dia, ao seu meio conhecido e reconhecido. As histórias recordadas e contadas por eles e elas, na sua simplicidade, nos ensinaram muito de sua cultura. As músicas e brincadeiras que animaram a interação foram uma integração da nossa cultura com a  cultura deste belo povo e suas lindas crianças.

Nossa equipe do CIMI, Alexandre, Natália e eu, a partir da realidade da aldeia, criamos as falas dos personagens (Tucano, Jacaré, menino, menina, onça, cobra…) e desenvolvemos teatro de fantoches falando sobre alimentação saudável, higiene, cuidado das árvores, plantas, animais, rios, córregos e nascentes. Também abordamos o tema das doenças e do alcoolismo, bastante problemático nas aldeias.   A participação das crianças e sua atenção demonstra seu interesse em aprender e ensinar para nós o que elas sabem e gostam de fazer.

Outra dinâmica utilizada por nós foi o do desenho comunitário, onde conjuntamente, cada um, cada uma pôde contribuir compondo o “Painel do Bem Viver”. Era uma disputa para fazer melhor, mais bonito e colocar seus dons artísticos no papel, unindo as cores do arco-íris no mesmo sonho da Terra sem Males.

Na Aldeia do Povo Kayabí, do outro lado do rio dos Peixes, bem próximo à Aldeia Apiaká, também desenvolvemos a mesma atividade, enriquecida com a presença de duas Palhacinhas muito engraçadas, alegres e animadas. Foi uma atração para as crianças que mantinham seus olhinhos fixos e radiantes de alegria. Eu e uma professora da aldeia animamos as crianças e adolescentes com músicas, histórias e diversas brincadeiras, numa interação com a  cultura indígena e não indígena. Aqui os desenhos foram feitos individualmente, com acompanhamento das professoras e depois foi montado o painel dos desenhos e das mãos.

 

A Serpente do Bem Viver foi um jogo criado por mim como forma de aprender brincando e se divertindo. Todos queriam jogar e ganhar, chegar no final do jogo em primeiro lugar. Em alguns momentos do jogo deveriam responder algumas perguntas, contar uma história, cantar uma música, falar uma poesia, imitar algum animal…e caso não fizesse teria que retroceder algumas casas.

 

O jogo  de vôlei para adolescentes, mais que uma disputa foi uma agradável maneira de conviver e cultivar a amizade, bem como exercitar o corpo e gastar energia acumulada, em contato com a natureza e a mãe terra.

Até a palhacinha serviu de inspiração para pintura. Eu me divirto muito com as crianças e sinto que a vida é tão simples e bela quando nos dedicamos a algo que amamos e deixamo-nos transformar por dentro e por fora, integrando-nos ao meio e sem pressa, sentar, olhar, ouvir, falar, sentir mais do que pensar e, acima de tudo, viver e conviver na simplicidade de ser com e estar inteira naquele lugar, como se as horas não passassem e o tempo se resumisse ao presente.

“Índio Terena, Kayabí e Apiaká. Ara a terra, lavra a terra, ama a terra que Deus dá…”

ATIVIDADE NA ALDEIA MERURE, DO POVO BOE (BORORO)

O nome “bororo” é um nome dado pelos não índios, surgido quando os exploradores perguntaram “qual o nome do povo”, e o indígena teria entendido “qual era o nome do local onde estavam”: eles estavam no bororó, que, para a língua bororo, significa “pátio da aldeia”. Sua autodenominação é BOE.

Os bororos habitam a região do planalto central de Mato Grosso e hoje já falam a língua portuguesa e cultivam sua própria língua materna. Estão distribuídos em cinco terras indígenas demarcadas: Jarudore, Meruri, Tadarimana, Tereza Cristina e Perigara e sua população atualmente é de mais de 2 000 indivíduos. São tradicionalmente caçadores e coletores, porém adaptaram-se à agricultura, da qual extraem sua subsistência. Destacam-se pela confecção de seu artesanato de plumagem (cocar e braçadeiras em pena) e também pela pintura corporal em argila.

 

As crianças fizeram também lindas pinturas comunitárias e interagiram muito bem nas atividades desenvolvidas com eles e elas.

Eu estudei Magistério no Ensino Médio e graduei em Comunicação Social e posso afirmar que nestes 28 anos de Educação Escolar e Popular, mais do que ensinar, aprendi e aprendo a cada dia no contato direto e na convivência com diversas culturas e pessoas, nesse universo que é para todos os seres e nessa Terra que coabitamos, a nossa Casa Comum, nossa Pachamama. Incansavelmente caminhamos e construímos a sociedade do Bem Viver!

“Viver, e não ter a vergonha de ser feliz. Cantar e cantar e cantar, a beleza de ser uma eterna aprendiz…”

Cuiabá, 17 de agosto de 2018.

Sandra Regina Duarte

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