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Os rios do Cerrado podem secar dentro de 25 anos

Os rios do Cerrado podem secar dentro de 25 anos

 

Grandes rios como o Araguaia, o Tocantins e o São Francisco caminham para o fim.

 

Os nossos Cerrados estão se transformando com a tomada avassaladora das áreas nativas pelas culturas do agronegócio. O prognóstico não é bom. A retirada da vegetação nativa diminui a capacidade do solo acumular água. A mata nativa do Cerrado chega a ter dois terços de sua massa embaixo da terra, é como se fosse uma floresta de cabeça pra baixo. As pequenas árvores raquíticas escondem um sistema subterrâneo vivo que se desenvolveu na história do planeta como o bioma mais antigo hoje existente no planeta. Essa rede subterrânea forma um sistema simbiótico com os lençóis freáticos, facilitando a permeabilidade da terra para a água das chuvas e favorecendo a alimentação dos lençóis freáticos subterrâneos. Ao mesmo tempo o rebaixamento dos lençóis freáticos seculares faz secarem as nascentes a começar pelos lençóis superficiais e por fim vai atingir os lençóis mais profundos. Isso quer dizer que nossos rios vão desaparecer. Segundo o professor Altair Salles Barbosa, o maior pesquisador do Cerrado, esse processo já atinge alguns pequenos riachos, mas deve chegar aos grandes rios, que deixarão de correr dentro de apenas 25 anos.

 

O potencial destrutivo desse processo é de inviabilizar não apenas os imensos projetos do agronegócio que retiram a vegetação nativa para dar espaço para lavouras e pastagens mas também cidades inteiras, podendo transformar nossa região se não em uma espécie de deserto, em um sistema muito parecido com a caatinga.

 

Já podemos ver esse processo acontecendo nos nossos grandes rios, o Araguaia e o Tocantins, que cada ano perdem parte do seu caudal. Em Ceres o Rio das Almas, que já foi um rio majestoso, profundo e perigoso, com corredeiras rápidas e implacáveis, hoje é um conjunto de poças de água mal cheirosa entre ilhas de pedra. As lavouras atacam o rio duplamente. Além de acabar com suas nascentes bombeiam enormes quantidades de suas águas para irrigar suas culturas. Quem anda pelo Cerrado estranha o contraste da sequidão da vegetação e pastagens com o verde das lavouras em plena época de seca. Para estas não falta agua; ainda.

 

Para nós que habitamos o Cerrado só resta fazer uma profunda mudança na nossa forma de viver e lidar com a terra. Plantar o máximo de árvores possível para que a água se mantenha no solo, recuperar as matas das nascentes e as matas ciliares dos rios, escolher melhor nossas culturas para explorar os recursos naturais com mais sensatez e por fim rezar para que o processo de rebaixamento dos lençóis freáticos seja atenuado. Recuperar a cobertura de cerrado não será mais possível porque essa vegetação não pode ser replantada e isso pode já ter condenado nossos rios que pelas previsões da ciência não voltarão a correr como antes nunca mais.

 

Além do Professor Altair, o naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire já observava a não regeneração expontânea dos Cerrados quando fez suas viagens pela Província de Goiás, em 1819. Em seu livro “Viagem à província de Goiás” ele diz: “Parece que fizeram em outros tempos plantações no meio da mata, pois em vários trechos vêem-se grandes clareiras tomadas pelo capim-gordura, planta que, como sabemos, é indício infalível de antigos desmatamentos.” (Pag 96) Ainda em outro trecho: “No meio da mata existem amplas clareiras onde nasce unicamente o capim-gordura (…) Essas clareiras tinham sido outrora cobertas de matas, que foram derrubadas para o cultivo da terra. Por fim foram invadidas pelo capim-gordura.” (pag 45) Para Altair, apesar de não ser possível recuperar o cerrado, é possível desenvolver técnicas para transformá-lo em matas e florestas. Assim, teremos que criar um novo cerrado através de muita pesquisa para escolher espécimes capazes de recompor nossa vegetação, e temos que fazer isso logo.

 

Quando a água acabar, os empreendimentos vão embora. Nós vamos ficar aqui para viver e sobreviver do que houver resultado.

 

Gerson Neto

Colaborador do Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Social

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