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Desmatamento ameaça Igarapé do Paraíso em Rondônia

Reportagem em primeira pessoa escrita por Jeiéli Lais, participante do Processo de Formação do Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social em Rondônia.

Nasci e cresci numa cidadezinha de 8 mil habitantes, Vale do Paraíso, está localizada região centro-oeste do estado de Rondônia, na floresta Amazônica, ou pelo menos no que restou dela por aqui. Rondônia é um dos estados mais desmatados da Amazônia e meu município se encontra na área provavelmente mais devastada do estado, eu não consegui dados precisos, mas pelas imagens de satélites do mapa isso é notável.

Foto 1 – Limites do Município Vale do Paraíso

O Rio Ji-Paraná ou Machado como é mais popularmente conhecido por aqui, é que dá o nome a bacia hidrográfica ao qual meu município pertence, mas o rio mais próximo a área urbana é o Igarapé do Paraíso(que chamamos aqui de Rio Paraíso), ele tem sua nascente no município de Nova união, desagua no Rio Jaru, que por fim deságua no Rio Ji-Paraná, nos limites da Reserva Biológica do Jaru, que abrange os municípios de Ji-Paraná, Vale do Anari e Machadinho d’Oeste.

Foto 2 – Igarapé do Paraíso
Foto 3 – Igarapé do Paraíso

Tenho presenciado ao longo dos anos o Rio Paraíso definhar, na infância costumava ir com meus irmãos pescar e banhar no seu trecho mais próximo da cidade(foto 2 e 3), hoje só é possível em locais mais distantes, que ainda preservam um pouco da vegetação, pois o local que íamos andando a pé, está raso por conta do assoreamento do seu leito. Na época da estiagem, especialmente nos meses de Junho a Setembro, o rio quase desaparece, nas águas (época de chuvas), também já não enche como antigamente. 

O maior problema é o fato de que a economia local gira em torno principalmente da pecuária, que realiza queimadas e derrubadas para a formação de pastagens, inclusive nas margens dos rios, áreas de várzeas e nascentes. O desmatamento já era cena comum na minha infância e diminuiu com as mudanças na legislação, mas nunca parou totalmente. Minha comunidade ainda vive com abundância de água, o município inteiro é banhado por pequenos córregos e nascentes. Talvez a maioria das pessoas não faça a ligação entre a floresta e as águas, não sabe que uma depende da outra pra existir, ou provavelmente crê que as duas são recursos infinitos por isso não se importa em preservar.

Outro problema que o Rio Paraíso vem sofrendo é pela retirada de areia do seu leito para comércio. Apesar da atividade ter licença ambiental emitida pelo Estado, a destruição é visível.

Foto 4 – Dragagem de areia no Igarapé do Paraíso
Foto 5 – Margens do Igarapé do Paraíso
Foto 6 – Margens do Igarapé do Paraíso
Foto 7 – Margens do Igarapé do Paraíso
Foto 8 – Margens do Igarapé do Paraíso

 Felizmente já existe uma preocupação de uma parte da comunidade com o futuro das nossas águas, tive o prazer de visitar recentemente a implantação de um projeto de recuperação de nascentes no município, uma parceria do Instituto Padre Ezequiel Ramin (IPER) com Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). O projeto já recuperou duas nascentes no município e outras duas estão em recuperação, conta com a participação de mutirões para plantar mudas de árvores na área demarcada, colaborando com a conscientização crescente a respeito da preservação e proteção das nascentes, córregos e rios da região. Apesar de pequeno ainda, a preocupação é crescente, o que nos dá esperança para continuar na luta para termos cada vez mais vozes se somando na defesa das nossas águas e florestas.

Foto 9 – Nascente em recuperação
Foto 10 – Nascente em recuperação
Foto 11 – Nascente em recuperação

 Tive o privilégio de nascer e crescer em Rondônia, aqui no meu Paraíso, rodeada de natureza, subindo em árvore, brincando com a terra, tomando banho de rio, pescando do ladinho de casa, liberdade que hoje meu próprio filho já não tem, não como eu tinha. 

Sabemos que a devastação tende a aumentar com o atual governo, já temos noticias de que o desmatamento voltou a bater recordes de crescimento, Rondônia é também o mais novo alvo das mineradoras, a ameaça é crescente e o futuro incerto, mas vamos à luta, não vamos entregar nossas águas e florestas sem lutar, pois nosso futuro, o futuro do mundo depende disso.

Jeiéli Laís Borges do Reis – Vale do Paraíso, Rondônia – 2019