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Construção de hidrelétricas preocupa região Panamazônica

Guajará-Mirim, 25 de agosto de 2016 – As consequências da enchente na Amazônia em junho de 2014 são lembradas com sofrimento pelos povos e comunidades da região. A experiência do desastre que afetou mais de 35 cidades foi relembrada durante os três dias do II Encontro Sem Fronteiras Brasil, Bolívia e Peru: Frente ao Câmbio Climático e os Mega Projetos de Infraestrutura – Povos e Comunidades do Campo e Cidade, Florestas e Rios em Defesa da Mãe Terra e Contra os Projetos de Morte, encerrado nesta quinta-feira (25), em Guajará-Mirim (RO).

Durante as atividades, os representantes das comunidades das cidades afetadas contaram a perda de produção, casas, animais, e que ficaram isoladas na época da enchente, atribuindo tais consequências a duas grandes hidrelétricas construídas no rio Madeira: a Santo Antônio e a Girau. “As dificuldades de 2014 estão misturadas com o medo de que haja outras enchentes”, relata o coordenador do Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social, Ivo Poletto, que participou do Encontro.

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Nesta quarta-feira (24), Poletto fez exposição sobre a campanha Energia para a Vida, que dá enfoque às energias renováveis, provenientes dos recursos naturais presentes nas terras de povos e comunidades tradicionais. “É preciso estudar alternativas à construção de hidrelétricas. Precisamos de políticas que favoreçam a produção de energia a partir dos raios do sol, do uso da biomassa, da produção de biogás e do uso de quedas naturais de água”, explicou.

Para o coordenador do FMCJS, a realização dos Seminários Regionais e do Encontro colabora para a construção de reflexões à luz das realidades locais e transfronteiriças, o que é importante para encontrar soluções aos efeitos das mudanças climáticas. Consequências reforçadas pela exposição do professor do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) Philip Fearnside, que falou sobre a contribuição das hidrelétricas para o efeito estufa. “As possíveis e já sentidas decorrências das mudanças climáticas, como as inundações e secas prolongadas, têm destruído tanto os espaços de vivências de povos e comunidades, como também ameaçado os próprios investimentos e empreendimentos”, ressaltou o professor.

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Colaborando com o tema, o engenheiro da Bolívia do S.O.S Amazônia Walter Justiniano falou aos presentes sobre as sequelas no país vizinho devido às barragens construídas no rio Madeira. Após a inundação de 2014, que vitimou fatalmente 60 pessoas e mais de 400 mil cabeças de gado e toda a produção agrícola, os processos da vida não foram recuperados. “Principalmente nas comunidades campesinas e indígenas, que não possuem apoio governamental e sofrem com insegurança alimentar e nutricional”, explicou. A construção das hidrelétricas de Cachoeira Ribeirão e de Cachuela Esperanza poderão, segundo o engenheiro, agravar ainda mais a situação das comunidades bolivianas do campo e da cidade.

Economia verde
As potencialidades na geração de energia elétrica com os recursos naturais existentes na Panamazônia, por meio da energia solar e a partir de oleaginosas naturais, como o coco babaçu, foram levantadas pelo professor da Universidade Federal de Rondônia Artur Moret. Ao abordar o tema das Energias Renováveis e sua Função no Enfrentamento às Mudanças Climáticas, Moret forneceu informações sobre a possibilidade de geração de energia sem a necessidade de hidrelétricas.

A exploração de petróleo em comunidades indígenas e extrativistas e o processo de fracionamento, conhecido como fracking também são preocupações das comunidades e povos da região Panamazônica. A professora do Conselho Indigenista Missionário do Acre (CIMI/AC) Bárbara ressaltou que este processo tem poluído o lençol freático e destruído ecossistemas fundamentais para a continuidade da vida humana e animal.

A Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação florestal (REDD) também foi abordada durante o II Encontro Sem Fronteiras. O professor do CIMI/AC Lindomar Padilha falou sobre as violações de direitos que o REDD representa para os territórios de povos e comunidades tradicionais. A explicação é de que o REDD provoca a privatização de terras originárias e ao mesmo tempo permite que empresas poluidoras em outros países comprem créditos de carbono oriundos da Amazônia, continuando o ciclo de poluição.

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Encerramento

Na noite de quarta-feira (24), a consciência foi celebrada por rituais e danças de diferentes povos indígenas com o canto Wari e Huni Kui, que ecoou no Centro de Treinamento São José de Guajará-Mirim. Os participantes anunciaram que, dançando juntos em roda, eram invocados os espíritos que tornarão mais forte e vitoriosa a aliança dos povos da Amazônia.

O II Encontro Sem Fronteiras terminou nesta quinta (25), com mesa de encerramento e a apresentação da Carta Final, que traz o compromisso dos povos em Defesa da Vida para unir forças para “impulsionar os processos de informação, conscientização, mobilização e fortalecimento das práticas milenares, que defendem o Bem Viver como alternativa e solução para enfrentar as mudanças climáticas decorrentes deste modelo econômico excludente”.

Fonte: Com informações do IMV/ Aliança dos Rios Panamazônicos.

Carta Final

“Das margens do rio Mamoré nossas vozes ecoam em defesa da mãe Terra e das filhas e filhos da Terra!”

Vindas e vindos do Amazonas, do Acre, da Bolívia, de Brasília, do Peru, do Mato Grosso e de Rondônia; das comunidades indígenas, das comunidades extrativistas (seringueiros, castanheiros e açaizeiros), das comunidades ribeirinhas, da agricultura familiar, das cidades, das comunidades de matriz africana, das comunidades campesinas, das veias dos rios: Madeira, Mamoré, Guaporé, Acre, Juruá, Purus, Madre de Dios, Abunã, Cabixi, Beni, Jamari, Machado, Juruena, Marmelo, São Miguel, Moa, Yata, Branco e Pimenta, todos violentados por projetos de infraestruturas (hidrelétricas, pequenas centrais hidrelétricas, termoelétricas, rodovias, hidrovias, mineração, pecuária, exploração madeireira, petrolífera, expansão da monocultura da soja, eucalipto, cana de açúcar, projetos de REDD, invasões de áreas protegidas, que culminam com ameaças e mortes de lideranças). Nos encontramos no II Encontro Sem Fronteiras – Bolivia, Brasil e Peru, na cidade de Guajará Mirim/RO, com o objetivo de trocar experiências de vida, fortalecer a luta e refletir os impactos desses grandes empreendimentos e as mudanças climáticas decorrentes da ação do sistema capitalista, por meio de empresas e governos, que não levam em conta a vida da Mãe Terra e de suas Filhas e Filhos.

Motivadas e motivados pela espiritualidade dos povos da floresta, das águas, do campo e das cidades, em uma só voz denunciamos as várias faces desse desenvolvimento perverso, que produz o Ecocídio, o Etnocídio e o Genocídio da mãe terra e alimenta o capitalismo selvagem, mercantilizando os rios, as florestas, o ar e a terra mãe, expulsando as filhas e os filhos da terra em favor dos projetos, que produzem morte cultural, econômica, social e organizacional dos povos indígenas, comunidades tradicionais, campesinos, comunidades de matriz africana e comunidades urbanas.

Reafirmamos nosso compromisso em Defesa da Vida, porque “nós somos guerreiras e guerreiros e não vamos deixar que matem a mãe Terra” e nos unimos em Aliança para impulsionar os processos de informação, de conscientização, de mobilização e de fortalecimento das práticas milenares, que defendem o Bem Viver como alternativa e solução para enfrentar as mudanças climáticas decorrentes deste modelo econômico excludente.

A Panamazônia precisa Viver para que a Mãe Terra, a Pacha Mama possa garantir a vida sadia das atuais e futuras gerações.

Guajará Mirim, 25 de Agosto de 2016.

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